Read O DIÁRIO DE BRIDGET JONES Online
Authors: Helen Fielding
Também
estou preocupada em como comemorar meu aniversário. O tamanho
do apartamento e da conta bancária não permitem dar uma
festa. Quem sabe faço um jantar? Mas aí eu teria de
ficar o tempo todo servindo as pessoas e odiaria os convidados assim
que chegassem. Podíamos sair para jantar, mas fico culpada
porque as pessoas têm de pagar a conta pois, egoísta,
obriguei-os a comemorar o meu aniversário gastando dinheiro
numa noite chata - mas também não posso pagar para todo
mundo. Ai, Deus. O que faço? Gostaria de não ter
nascido mas sim ser o resultado de uma imaculada conceição
como Jesus, mas não exatamente da mesma forma que Ele, assim
não precisava comemorar o aniversário. Sinto-me
solidária com o constrangimento que Ele deve sentir porque há
dois mil anos quase o mundo inteiro é obrigado a comemorar Seu
aniversário.
Meia-noite.
Tive uma boa idéia para o aniversário: convidar todo
mundo para um coquetel, talvez
manhattans
.
Assim, posso oferecer algo aos convidados, no melhor estilo de uma
grande dama da sociedade. Se as pessoas mais tarde quiserem jantar,
ora, podem ir. Não sei bem como se prepara um manhattan, vou
pesquisar. Posso comprar um livro que ensina a fazer coquetéis.
Para ser sincera, acho que não vou comprar.
QUINTA-FEIRA,
16 de março.
57,6kg,
2 unidades alcoólicas, 5 cigarros (m.b.), 2.140 calorias
(quase só comi frutas), 237 minutos gastos fazendo lista de
convidados (ruim).
Eu Sharon
Jude Richard
o Vil
Tom Jerome(eca)MichaelMagda Jeremy
Simon
Rebecca Martin Chato de Galocha
Woney Cosmo
Joanna
Daniel? Perpétua? (argh) e
Hugo?
Ai, não. Ai, não. O que faço?
Acabo
de ligar para Tom que disse, com muita sensatez:
—
O
aniversário é seu e você deve convidar única
e exclusivamente quem quiser.
Então,
só vou convidar as seguintes pessoas:
Sharon
Jude
Tom
Magda
e Jeremy
e preparar
um jantar para todos. Liguei de novo para comentar a lista com Tom e
ele perguntou:
—
E
Jerome?
—
O
quê?
—
E
Jerome?
—
Achei
que como você disse que eu só devia convidar... - parei
no meio da frase porque se dissesse "quem eu gosto"
mostraria que não gostava do insuportável e pretensioso
namorado dele.
—
Ah! - mostrando um susto exagerado.
—
O seu Jerome? Claro que ele está convidado, bobo. Mas você
acha que fica ruim não chamar Richard o Vil, da Jude? E a
Woney, apesar dela ter me convidado para o aniversário na
semana passada?
—
Ela
jamais vai ficar sabendo.
Quando
eu disse a lista de convidados para Jude, ela concluiu:
—
Ah,
então pode-se levar o namorado? - o que significa Richard o
Vil. Bom, já que tem mais de seis pessoas, então vou
ter de convidar o Michael. Bom. Acho que nove pessoas está
perfeito. Dez, contando comigo. Ótimo.
Logo depois, Sharon
ligou.
—
Espero
não ter dado um fora. Encontrei a Rebecca, perguntei se ela ia
ao seu aniversário e ela fez uma cara bem ofendida.
Ah.
não, vou ter de convidar Rebecca e Martin Chato de Galocha.
Que chateação. Com isso, tenho de chamar a Joanna
também. Merda. Merda. Como eu já disse que vou fazer um
jantar não posso de repente avisar que vamos a um restaurante
porque vai parecer que sou fresca e mesquinha.
Ai,
Deus. Acabei de entrar em casa e ouvir na secretária
eletrônica um recado gélido e ofendido de Woney.
—
Cosmo
e eu queríamos saber o que você gostaria de ganhar de
aniversário este ano. Ligue para nós, por favor.
Já vi que vou
passar o dia do meu aniversário cozinhando para 16 pessoas.
56,7kg,
4 unidades alcoólicas (entediada), 23 cigarros (péssimo,
já que fumados em duas horas), 3.827 calorias (odioso).
14h.
Humm. Era só o que me faltava. Minha mãe adentrou o
apartamento e, por milagre, a crise da cigarra que cantou o verão
inteiro tinha passado.
—
Ó
meu Santo Pai, querida! - disse, ofegante, indo direto para a
cozinha.
—
Você teve uma semana ruim ou alguma coisa assim? Está
com uma cara péssima. Parece que tem noventa anos. Mas sabe de
uma coisa, querida? perguntou, dando uma voltinha, segurando a
chaleira e baixando os olhos modestamente, depois me olhando como se
fosse uma grande dançarina pronta para iniciar um
show
de sapateado.
—
O
que houve? - respondi, de má vontade.
—
Arrumei
um trabalho como apresentadora de televisão.
Vou fazer compras.
DOMINGO,
19 de março.
56,2kg,
3 unidades alcoólicas, 10 cigarros, 2.465 calorias (quase só
chocolate).
Puxa.
Estou encarando meu aniversário de outra forma, totalmente
positiva. Estive conversando com Jude sobre o livro que ela está
lendo sobre os ritos de passagem dos povos primitivos e isso me
deixou feliz e serena.
Cheguei
à conclusão que é fútil e errado achar
que o apartamento é pequeno demais para receber 19 pessoas,
que não posso passar o dia do meu aniversário
cozinhando e que seria melhor me arrumar e ir a um restaurante fino
com um deus do sexo portador de um cartão de crédito
ouro. Em vez disso, vou considerar meus amigos como uma enorme e
calorosa família africana, ou talvez turca.
Nossa
cultura é muito obcecada por aparência, idade e situação
sócio-econômica. Mas o que vale mesmo é o amor.
Essas 19 pessoas são amigas minhas; elas querem ser recebidas
na minha casa para festejar com carinho meu aniversário e
apreciar uma comidinha caseira - e não para avaliar nada. Vou
fazer uma torta de carneiro para todos no melhor estilo caseiro. Vai
ser uma festa simpática e alegre, como nas tribos étnicas
do Terceiro Mundo.
57kg,
4 unidades alcoólicas (estou entrando no clima), 27 cigarros
(último dia antes de parar), 2.455 calorias.
Resolvi
fazer uma torta de carneiro e uma salada de endívias belgas ao
forno com fatias de Roquefort e chorizos grelhados para dar um toque
diferente (não experimentei a receita, mas tenho certeza que é
fácil), seguidos por suflês ao Grand Marnier servidos em
terrinas individuais. Estou ansiosa pelo dia do aniversário.
Espero ficar famosa como grande cozinheira e anfitriã.
TERÇA-FEIRA,
21 de março:
ANIVERSÁRIO
57kg,
9 unidades alcoólicas*, 42 cigarros*, 4.295 calorias*. (*Se
não posso me esbaldar no meu aniversário, quando é
que vou poder?)
18h30.
Não dá mais. Acabo de pisar numa panela de purê
de batata com os sapatos novos de camurça preta da loja
Pé
no chão
(melhor dizer
Pé na batata). Esqueci que o piso da cozinha e todas as
superfícies da cozinha estão cobertas de panelas de
picadinho de carne e purê de batata. Já são quase
seis e meia e tenho de ir à Cullens comprar os ingredientes do
suflê ao Grand Marnier e outras coisas que esqueci. Ai, meu
Deus, de repente lembrei que o tubo de gel anticoncepcional deve
estar ao lado da pia. Preciso guardar também os potes
decorados com uns esquilos cafonas e esconder o cartão de
aniversário que Jamie mandou com a foto de uma ovelhinha e os
dizeres: "Feliz Aniversário, sabe onde você está
agora?" E dentro do cartão: "Cruzando o Cabo da Boa
Esperança."
Agenda:
18h30
- Compras.
18h45
- Voltar para comprar os enlatados que esqueci.
18h45-7
- Preparar a torta de carneiro e colocar no forno (ai, Deus, espero
que caiba tudo).
19-19h05
- Preparar os suflês ao Grand Marnier (acho que vou dar uma
provadinha no licor agora. Afinal, é meu
aniversário).
19h05-19h10.
- Hum. O Grand Marnier está uma delícia. Preciso
arrumar os pratos e talheres para ninguém achar que está
tudo uma bagunça e dar um jeito na cozinha. Ah, tenho de
comprar guardanapos também (ou será que é
serviettes
?,
nunca lembro como se usa chamar).
19h10-19h20
- Limpar tudo e encostar os móveis na parede da
sala.
19h20-19h30
- Fazer as tais fatias grelhadas de chorizo.
Com
isso, sobra uma boa meia hora para me aprontar, então não
há razão para ficar nervosa. Preciso de um cigarro.
Argh. Faltam quinze para as sete. Como é que
pode?
Argh.
19h15.
Voltei da loja e percebi que esqueci a manteiga.
19h35.
Merda, merda, merda. A torta de carneiro ainda está em panelas
espalhadas pelo chão da cozinha inteira e eu ainda não
lavei o cabelo.
19h40.
Ai, meu Deus. Fui pegar o leite e percebi que esqueci a sacola de
compras nos fundos da loja. Os ovos estavam dentro. O que significa
... Ai, Deus, o azeite também... então não dá
para fazer a tal salada.
19h40.
Hum. A melhor coisa a fazer, com certeza, é entrar na banheira
com uma taça de champanhe e me aprontar. Se eu estiver linda,
posso continuar cozinhando depois que todo mundo chegar e talvez
consiga que Tom vá buscar os ingredientes que estão
faltando.
19h55.
Aargh. Tocou a campainha. Estou de calcinha, sutiã e cabelo
molhado. O chão da cozinha está cheio de torta. De
repente, odeio os convidados. Tive de ficar como uma escrava por dois
dias, agora eles vão se acomodar e ficar pedindo coisas como
cucos esfomeados. Dá vontade de abrir a porta e berrar: "Ah,
fodam-se!
"
2h
da manhã.
Estou
muito emocionada. Quando abri a porta, vi Magda, Tom, Sharon e Jude
com uma garrafa de champanhe. Eles disseram para eu me aprontar logo
e, enquanto sequei o cabelo e me vesti, eles limparam toda a cozinha
e jogaram fora a torta de carneiro. Magda tinha reservado uma grande
mesa no restaurante 192 e dito a todo mundo para se encontrar lá,
e não no meu apartamento; eles ficaram me esperando com
presentes e ainda me pagaram o jantar. Magda disse que tiveram um
sexto sentido estranho e quase paranormal de que o suflê ao
Grand Marnier e aquela história de salada não iam dar
certo. Adoro meus amigos, são melhores que uma enorme família
turca com lenços esquisitos na cabeça.
Uma coisa é
certa: no próximo Ano-Novo vou renovar minhas resoluções,
com os seguintes acréscimos:
Eu
Vou
Parar de ser tão
neurótica e ter medo das coisas.
Não
vou
Mais dormir com,
nem tomar conhecimento de, Daniel Cleaver.
ABRIL
Equilíbrio
interior
DOMINGO, 2
DE ABRIL
57kg,
0 unidade alcoólica (maravilhoso), 0 cigarro, 2.250
calorias
Li numa
reportagem que a escritora Kathleen, finada esposa do finado
teatrólogo Kenneth Tynan tinha “equilíbrio
interior” e só escrevia se estivesse perfeitamente
arrumada, sentada numa mesinha no centro da sala e tomando um copo de
vinho branco gelado. Se estivesse atrasada para entregar um texto
para Perpétua, Kathleen Tynan jamais ficaria toda vestida e
apavorada embaixo do cobertor , fumando sem parar, engolindo uma
caneca de saquê frio e se maquiando para fugir da obrigação.
Kathleen Tynan não permitiria que Daniel Cleaver dormisse com
ela quando bem entendesse sem ser seu namorado. Também não
beberia demais nem vomitaria. Eu gostaria de ser como Kathleen Tynan
(mas, claro, não gostaria de estar morta).